quarta-feira, 31 de março de 2010

Cinco dedos e duas mãos

  Nunca fui da turma dos que queriam pouco. Meu problema sempre foi querer demais. Querer mais do que cinco dedos são capazes de pegar, mais do que as duas mãos juntas conseguem agarrar. Nunca desejei menos, nunca quis pouco. Sempre padeci de excessos.
  Até na dúvida, escolho no exagero. Quase não me lembro de alguma vez em que não tive escolha. É melhor ter que escolher entre alguma coisa, do que não ter o que escolher. Isso sim é pior. Escolher entre o nada e o coisa alguma me soa angustiante. Sempre padeci de excessos. Sou um inveterado da quantidade.

terça-feira, 23 de março de 2010

Jogo da vida

 As vezes eu acho que a vida joga no meu time. Que toca pra mim, me convoca a fazer tabela, cabeceia meu escanteio e empurra a bola para nada atrapalhar minha falta. E quando isso acontece, o time todo fica em sintonia. Mas de repente, não sei bem dizer quando, a vida parece que toma um cartão vermelho e ao invés de só ficar de fora, resolve jogar no outro time. Arma contra mim. Cria jogadas ensaiadas. Domina a situação de tal maneira que me faz até fazer gol contra.
 E é nesse girar da moeda, quando a cara vira coroa e a vida muda de time, que ela parece jogar melhor.

terça-feira, 9 de março de 2010

Gente vazia


 Não tenho paciência pra gente vazia. Não que eu me ache excepcionalmente cheio, mas com gente vazia, fujo de me misturar. Quando encontro um desses sujeitos vazios, seja de sentimento, de compaixão, de afeto, de respeito, trato logo de me afastar. Pior é quando encontro quem é vazio de tudo, esses acabam se perdendo na própria vastidão.
 Não que sejamos limitados e à medida que a coisa avança, ficamos cheios e temos que nos esvaziar. A possibilidade humana é infinita! Não entendo como num mundo com tanta coisa a espreita, vamos nos pautar logo em exemplo vazios. Vazios de exemplicidade.
 Engraçado que gente vazia se acha cheia: de razão, de atitude, de coragem. Chatice! Eu achava que gente vazia podia se conhecer. Todos eles. Conhecem-se, misturam-se e com o oco dos seus corpos, preenchem-se. É quase como uma ajuda. Um vazio é só um vazio, mas um monte de vazio até dá um cheio. Não garanto qualidade, não garanto que será um cheio de se admirar... mas e daí? Ainda que não seja só um vazio, está valendo. Eu acho

Licença de parar

Passa vida,
Passa a farra
Passa a agitação

Passam as moscas
Passam as flores
Passam na estação
Passa num ano

Passa o seu vizinho
Passa o seu João
Passa o manequinho
Passa o vendedor de pão

Passa rápido
Passa voando
Todo mundo passa andando

Dou licença então,
já que todo mundo tá passando
E peço licença também,
as vezes quero ir parando

Poema feio

Começo querendo escrever um poema
Me deixo levar pelas linhas, rimas,
pelo som das liras...
Mas aí nada rima
Nada flui naturalmente
Fica tudo engessado,
duro,
oco!
Queria escrever um poema
Desses bonitos, como os que eu gosto
Versos Quintanos, Carpinejanos,
mas não dá!
Não sou desses.
Nasci pra versos feios
Sem rima
Amontoado de palavras

Mas não vou reclamar
Se assim for
Se meu divinatório dom for o de poemas afeados
Quem há de se importar?
Se os poemas são como filhos
Talvez eu tenha essa vocação
Talvez, tenha nascido só pra ser isso
Pai de poemas feios