quinta-feira, 14 de março de 2013

A mulher que contrariou o progresso


Hoje eu fui de táxi para o trabalho. Normalmente uso o transporte público, mas seja por atraso ou preguiça, acabei optando por esticar a mão e pedir ao motorista que me levasse "voando" ao meu destino. Enquanto mandava mensagens pelo celular, revezava os ouvidos entre um reprodutor de músicas digitais e o possível anúncio de um novo papa.
Hoje eu estava num táxi seguindo para o trabalho quando, ao parar no sinal vermelho, uma mulher gorda, suja e mal vestida, aproximou-se da janela do motorista e abriu um papelão, onde se podia ler:

"Meu filho tem 2 ano e precisa de ajuda. Operou intestino. Precisa de fralda, comida e remédio."

Seu olhar perdido e vazio ainda conservava alguma esperança de sabe-se lá o quê e, talvez isso, fizesse ela ter ficado ali parada por quase um minuto enquanto o motorista, sem nenhum constrangimento, a ignorava. Invisível, mesmo gorda, suja e mal vestida, ela tentou ainda fitar o rosto de mais um ou dois motoristas que, por detrás de seus carros com vidro fumê, estavam por demais ocupados para dar-lhe alguma atenção. Na iminência do sinal abrir, ela fecha o papelão, abaixa a cabeça, vira-se de costas e segue para o canto da rua.
A pobreza bate na porta e a gente finge que não escuta. E faz o que costuma fazer com tudo que a gente não gosta - ignora, isola, exclui.
22 milhões de pessoas saindo da linha da miséria não tem importância perto de uma mãe, no sinal, gritando -em silêncio- pelo seu filho doente.
A eleição do novo papa não tem importância perto de uma mulher que, embora estivesse ali por uma causa nobre, só fosse reconhecida como uma entidade "gorda, suja e mal vestida".
Cheguei no trabalho ainda antes do horário previsto. Paguei a corrida, guardei o celular, o reprodutor de músicas digitais e o pouco que ainda me restava como esperança. Eu sou miserável. Meus sonhos são miseráveis. A vida é uma porcaria.

Aquela mulher no sinal contraria o progresso. E é a prova de que a gente, como espécie humana e indivíduo social, definitivamente fracassou.
( Tata Jesucristo - Francisco Goitia )